26 maio 2008

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Extraído do Diário, Paris, dia de Natal, 1882. Citado em Life of Anna Kingsford – vol. II, págs. 96-97 e 100-102.

RELATIVO AO POETA

O poeta não tem nenhum eu separado do seu grande eu. Alguns homens passam indiferentes pela vida e pelo mundo, porque a personalidade da Terra e do céu é algo separado deles, e não os toca. Contudo, a personalidade do poeta é Divina e, sendo Divina, não tem limites. Ele é supremo e onipresente na consciência; seu coração bate em todo elemento. Os pulsos de todas as profundezas do céu vibram no seu próprio e, reagindo às suas forças e plenitudes, ele sente mais intensamente do que os outros homens. Ele não apenas vê e examina essas rochas e árvores; essas águas variáveis e esses picos cintilantes. Ele não apenas ouve o vento plangente, o rufar dos repiques dos sinos. Mas, ele é tudo isso; e com eles – não, neles – rejubila-se e chora, brilha e aspira, suspira e ressoa. E, quando canta, não é ele – o homem – cuja voz é ouvida; é a da toda a própria natureza. Nos seus versos, o brilho do sol ri; as montanhas lançam longe seus sonoros ecos; o relâmpago veloz brilha. A grande cadência da vida universal move-se e torna-se articulada na linguagem humana. Ó alegria profunda! Ó ilimitada personalidade! Ó personalidade parecida com Deus! Todo o ouro do pôr-do-sol é teu; os pilares de crisólito; e a abóbada púrpura da imensidão! O mar é teu, com seu solene discurso, em sua distância enevoada e seus baixos radiantes! As filhas da terra te amam; as ninfas das águas te contam seus segredos; tu conheces o espírito de todas as coisas silentes! Os raios de sol são teu sorriso, e as gotas de chuva do céu, tuas lágrimas; no furor da tempestade, teu coração balança; e tua prece sobe com os ventos até Deus. Tua arte multiplica-se na consciência de todas as criaturas vivas; tua arte torna-se jovem com a juventude da natureza; tua arte é toda vista como os céus estrelados. Como para os deuses – tua arte é por eles amada; sim, se tu esmoreceres, eles te contarão todas as coisas; porque somente tu compreendes, dentre todos os filhos dos homens!

(...) Sinto-me feliz por encontrar neste mundo o depoimento de alguém que tenha conseguido, num momento de iluminada lucidez, registrar no papel, a essência da alma do poeta.
Catarina Poeta

22 maio 2008

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VAZIO EXISTENCIAL

Amar alguém é estar em comunhão profusa com outro ser. No entanto, a grande maioria das pessoas só conhece o amor como sensação — “os meus filhos”, “a minha mulher”, “a minha propriedade”, “o meu conhecimento”, “a minha realização”. A vida destas pessoas, em todas as direções, leva à exclusão; ela é um impulso de auto-isolamento da parte do pensamento e do sentimento; às vezes elas conseguem se comunicar com o outro; outras, ficam apenas num monólogo a dois. Eis por que existe o enorme problema que assola a humanidade atualmente: a sensação avassaladora de vazio. Mas, porque as pessoas sentem um enorme vazio existencial? Por que a vida parece vazia para algumas pessoas? Embora sejam muito ativas, embora freqüentem o cinema, embora se divirtam, amem e trabalhem, a vida é vazia, tediosa, mera rotina. Por que os relacionamentos destas pessoas são tão superficiais, estéreis e sem muito sentido? Respeitabilidade, posse e vazio. Como ir além dessa solidão, dessa insuficiência, dessa pobreza interior? A maioria das pessoas não deseja fazê-lo e fica satisfeita com a maneira como é; é muito cansativo descobrir uma coisa nova, e por isso preferem permanecer como estão — e aí reside a verdadeira dificuldade. Existem muitas coisas que dão segurança às pessoas; edificam paredes ao redor de si próprias, com as quais ficam satisfeitas e, ocasionalmente, há um murmúrio vindo de além da parede; há de vez em quando um terremoto, uma revolução, uma perturbação que logo neutralizam. Assim, a maioria na realidade não quer ir além do processo de auto-isolamento; tudo o que procuram é um sedativo, a mesma coisa numa outra forma. A insatisfação é bem superficial; querem uma coisa nova que os satisfaça, uma nova segurança, uma nova maneira de se proteger — o que é, mais uma vez, o processo de isolamento. O que estão procurando, não é ir além do isolamento, mas reforçá-lo de modo que ele venha a ser permanente e livre de interferências. São poucos os que desejam derrubar as barreiras e ver o que existe para além disso que chamamos de vacuidade, solidão. Aqueles que buscam um substituto para o antigo ficarão satisfeitos ao descobrir algo que proporcione uma nova segurança, mas há evidentemente quem queira ir além disso. Quem queira realmente preencher o vazio.

20 maio 2008

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CENTELHA

Minha intensidade
nem sempre é compreendida.
Meu elo aparente
me desliga de tudo.
Ao que me inspira,
vou além do que procuro...
Alguém que saiba
me amar por inteira


Catarina Poeta


... E, me encontro nos versos de Pablo Neruda, o Poeta Universal:


"Tenho fome de tua boca, de tua voz, teus cabelos
e pelas ruas vou sem me nutrir, calado,
Não me sustenta o pão, a aurora me desconcerta,
procuro o líquido som de teus pés pelo dia.
Faminto estou de teu sorriso resvalado,
de tuas mãos cor de furioso celeiro,
tenho fome da pálida pedra de tuas unhas,
quero comer tua pele como intacta amêndoa"

De Cien Sonetos de Amor

12 maio 2008

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REVELAÇÃO

Vindo,
surgindo,
saindo...
Brotando,
lutando,
ficando...
Nascendo,
crescendo,
vivendo...
Buscando,
encontrando,
adorando ...
Investindo,
sentindo,
descobrindo...
Acalanto,
encanto,
Amor
Catarina Poeta

09 maio 2008

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OLHANDO ALÉM

“Quando o sol bater
Na janela do teu quarto,
Lembra e vê
Que o caminho é um só”

Esta Composição de Dado Villa-Lobos/Renato Russo/Marcelo Bonfá, fala de oportunidade. E, de fato, a oportunidade bate uma única vez em nossa porta e quem sabe aproveitá-la, alcança êxito. É assim com tudo na vida. No dito popular, diz-se que o “cavalo encilhado só passa uma vez na frente da porteira”. Fazendo uma analogia, qualquer oportunidade perdida, seja ela de cunho profissional ou pessoal, poderá deixar muita coisa para trás, fazendo o sujeito perder um tempo muito precioso. Para que isto não ocorra, é preciso aguçar a percepção e os sentidos, analisando com bastante cautela todos os prós e contras de uma oportunidade que surge à frente. Vale a pena enfatizar que, ao surgir uma nova oportunidade em sua vida, lembre-se de analisar dois pontos importantes: o que ela trará de felicidade para você e o bem que ela fará às pessoas que estão à sua volta. E, se o cavalo for mesmo bom, monte-o e não o deixe escapar de você, pois só cruza a linha de chegada, quem realmente pretende ser um vencedor.

05 maio 2008

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IDENTIFICAÇÃO

Identifico a tua angústia,
um certo brio recolhido,
uma tristeza vazia,
uma desconforto,
uma omissão...
Identifico tuas horas
contidas de alegria,
os teus gritos sufocados,
os gemidos guardados
pelo prazer não vivido...
Identifico a dor no teu
olhar compenetrado,
o teu silêncio vazio,
o mergulho no profundo
do teu ser...
Identifico você num espelho
refletido que olho todos os dias,
através da retina,
que timbrou tua imagem em mim


Catarina Poeta

01 maio 2008

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FILOSOFANDO

"No amor ocorre o paradoxo de dois seres se tornarem um, mas continuarem a ser dois." (Erich Fromm). A imagem acima é de Mauritus Cornelis Escher, que nasceu em Leeuwarden na Holanda em 1898 e faleceu em 1970, um arquiteto que dedicou toda a sua vida às artes gráficas. Na figura, ele é ele, ela é ela; mas ele é ela, e ela, ele. O corpo é um só, mas é dois. Nada existe, para que tudo possa existir. Incorporado isso, todas as metáforas, movimentos, traçados, sonhos, surgem daí. Os sábios dizem "não um" para nos lembrar de que a unidade não nega a multiplicidade, e que a natureza última do universo não é uma pasta uniforme sem nenhuma individualidade, sem dualidade, sem separação. Quando há dois seres existe a possibilidade de haver unidade entre eles; o fato de eles serem "um" possibilita sua manifestação em "dois". O fantástico é perceber a mesma estrutura, o mesmo processo atuando no universo: eu/mundo; eu/outro; vida/morte.


Confronto

O espelho revela a outra face...
A face que desconhecemos.
E ela questiona sobre tudo
Aquilo que não podemos responder.
O espelho é a resposta refletida
Da imagem que não temos.
A face revelada no espelho sorri
Para o rosto que a está olhando.
A outra face se entristece
Com o olhar fosco que a reflete.
A face que olha se emociona
Ao ver a outra face triste.
E quando a face que olha
Sai da frente do espelho,
A face refletida morre,
Levando consigo as feições
De alguém estranho
Que imaginava conhecer

Catarina Poeta